segunda-feira, 4 de abril de 2011

Quo Vadis, Europa? (Parte II)


Conforme foi dito no meu último post, nesta segunda parte fiquei de apresentar algumas soluções para o rumo da União Europeia. Estou longe de ser uma perita, contudo, pretendo lançar algumas pistas e/ou ideias num sentido específico: em primento lugar, pôr termo ao neoliberalismo que assola a orientação da política europeia; em segundo, lançar bases para um novo paradigma a médio e longo prazos. (Convém fazer uma ressalva, o Orçamento para a União Europeia não excede 1% do PIB do conjunto dos 27 Estados-Membros. Ao contrário do que se pensa, não são valores exorbitantes.)
  1. Dizer não: está na hora de 'bater o pé' no Conselho Europeu e rejeitar que sejam as economias periféricas a pagar a factura das perdas dos bancos das economias centrais e as má escolhas políticas dos respectivos governos. A meu ver, desde que a Grécia foi tornada num protectorado europeu e se tornou óbvio que outros países seguir-se-iam, ficou claro que os representantes grego, irlandês, português, espanhol (e belga e italiano?) deveriam ter-se reunido e elaborado uma estratégia a apresentar perante o eixo franco-alemão.

  2. Alteração do estatuto do BCE: numa crise desta natureza, não faz sentido que a actuação desta instituição seja única e exclusivamente orientada para a “manutenção da estabilidade dos preços.” Ao limitar-se os Estados na sua actuação contra as crises económicas, o BCE tem de apoiar os países vulneráveis, designadamente, através da emissão de dívida europeia – os chamados eurobonds. Não faz sentido que o BCE financie os bancos em vez de financiar os Estados da zona euro. Portanto, além do controlo da inflação, o BCE deve poder ajudar as economias em crise.

  3. Declaração de guerra contra as agências de rating: um dos principais erros na actuação da UE foi o seu silêncio ou a sua não actuação contra as agências de rating. Não é possível que estas instituições cujos critérios são altamente duvidosos (mais uma vez relembro o papel desempenhado no alvorar da crise de 2008), continuem a emitir declarações e a “classificar” países conforme lhes apetece. Não estamos a falar de corridas ou concursos, estamos a falar de Estados, sociedades e pessoas. De imediato a UE deveria não só ter condenado as agências de rating realçando de forma veemente a sua conivência na crise, como ter criado mecanismos que permitam interpor acções judiciais. É a única forma de lidar com instituições desta natureza que não têm escrúpulo algum.

  4. Harmonização das políticas laborais e sociais. Neste momento, temos países que competem com outros através da desvalorização salarial (o caso de Portugal é um bom exemplo), é consequência das limitações do PEC e de um moeda forte. Uma união económica e monetária não pode ignorar questões desta natureza e os custos sociais que delas advêm, portanto, devemos considerar a harmonização (o que não significa desregulação) dos sistemas laborais e sociais. Como é óbvio, defendo uma harmonização feita por cima, isto é, que caminha no sentido de que todos os Estados-Membros adoptem o melhor modelo possível e o mais favorável aos trabalhadores. É igualmente uma excelente forma de impedir a “fuga de cérebros” e pode prevenir a deslocação de empresas.

  5. Harmonização fiscal: a moeda única precisa de um suporte fiscal justamente para que, quando surgem crises como esta, a zona euro tenha margem de manobra sem ficar dependente da contribuição dos Estados-Membros mais ricos. Embora hajam diversos modelos em cima da mesa, a minha escolha recai justamente na taxação das transacções financeiras e nas mais-valias que delas derivam. Este modelo combinado com o forte combate contra os offshores, seria uma enorme de fonte de receitas para a preservação do modelo social europeu assim como a elevação do padrão de vida dos trabalhadores e desempregados por toda a zona euro.

  6. Alteração do paradigma: após a adopção das medidas anteriormente anunciadas, estaria na altura de se pensar sob que modelo a construção europeia deve concretizar-se. A meu ver, o socialismo é o único caminho que trará justiça económica e social não só dentro e entre os diversos Estados-Membros, como também no tipo de relações externas que a União desenvolve. No primeiro caso, não podem ser os trabalhadores europeus a pagar a factura da especulação financeira nem a sustentar uma elite económica. No segundo caso, não é possível que as decisões de natureza económica caibam apenas aos países ricos, isto não é sinónimo de união mas sim do seu contrário. Finalmente, uma Europa socialista, aberta e justa só pode caminhar no sentido da melhoria das relações com os seus vizinhos e outros países mais distantes. A União, como potência comercial e económica que é, pode contribuir para um modelo internacional mais justo do que o que pratica actualmente e do que aquele exigido pela Organização Mundial do Comércio mas isto já é matéria para futuros posts.



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