segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Arrebenta a bolha


...ou de quanto tempo mais precisaremos para perceber que varrer a poeira para debaixo do tapete só acumula a porcaria? Os EUA já começam a ter problemas. Aqui a coisa também não vai boa.

Os bons velhos tempos da modernidade suspensa em trabalho forçado e sobreexploração de recursos acabaram. E a nós falta a mais rudimentar das infraestruturas tecnológicas e sociais.

Quando este pardieiro der o berro, vai cair e vai cair com força. Tendo em conta que quem pode segurar o barco ou não sabe ou não quer saber como o fazer, já não reservo muita fé no futuro.

Entretanto, acabaram-se-me as metáforas.

Vigília de Solidariedade para com o povo Egípcio

Anda a correr pelo Facebook uma chamada a uma vigília de solidariedade para com a revolução egípcia, terça-feira, dia 1 de Fevereiro, no Largo Camões, Chiado, Lisboa

http://www.facebook.com/#!/event.php?eid=185037951519230

"O objectivo é recolher assinaturas para posteriormente entregar na Embaixada do Egipto em Portugal pedindo o fim da violência para com os manifestantes."

Acho que faria mais sentido recolher assinaturas a exigir a demissão de Mubarak, e demonstrar apoio ao aprofundamento da revolução, do que apelar ao "humanismo" dos repressores. Mas enfim, pacifismos bem pensantes à parte, a solidariedade com a revolução é o mais importante, pelo que lá estaremos.

Respiganço

Andando pelos caminhos da web, encontrei em http://www.ielt.org/pagina/investigacao/9, um texto muito interessante que reproduzo aqui, em parte:

"Os respigadores e a respigadora

O filme OS RESPIGADORES E A RESPIGADORA de Agnès Varda (2000) oferece pistas para a reflexão sobre o trabalho da colecção, da memória, do museu, da (re)criação. Enformado por esta perspectiva teórica, estudam-se RESTOS , sobras, excrementos, ruínas, cinzas, memórias: less is moreHistória da Carochinha, A Formiga e a Neve, O Pito-Suro, O Macaco e a Romãzeira ). O discurso reinante e o poder do pequeno, questões de linguagem nos textos em que os vivos se entendem. (François Dagognet), pormenor e diversidade, desafios ao cânone.
"À mão de respigar"
Colecção "à mão de respigar" (Apenas Livros/ IELT com o incentivo do Centro de Tradições Populares Portuguesas Prof. Manuel Viegas Guerreiro). Esta colecção de folhetos de cordel (vd. PUBLICAÇÕES) nasce justamente desta atitude face ao resto que vem enformando todo o trabalho destes investigadores: a literatura tradicional como resto, sobra de uma realidade cultural em extinção. Pela sobriedade e simplicidade, poderíamos adjectivar a literatura tradicional de humilde, termo que transporta consigo humus, solo, rente ao solo. Serve esta denominação porque ela também implica a ideia de fertilização operando sobre a cultura erudita de um país. Uma representação iconográfica da Humildade é a de uma mulher com a mão esquerda no peito, mantendo a direita estendida e aberta. O rosto dirige-se para o céu e os pés pisam um víbora enrolada a um espelho partido. A humilde literatura de transmissão oral seria bem representada pela Gata Borralheira: porque se diz ao borralho, à lareira; porque é cinzas, borralho; porque não é ou não parece nobre; porque se torna nobre com a acção de príncipes que a acordam e a despertam (a "Bela Adormecida" de que falava Garrett em relação à pátria... ); e finalmente porque... vestida para ir ao baile, parece uma princesa. A roupagem em que se envolve - afinal, o olhar com que nela atentamos, a dignidade com que a publicamos em folheto ou obra de lombada - coloca-a no seu lugar essencial e não no lugar acessório e supérfluo do adereço ou da curiosidade 'folclórica'.
Lidar-se-á com o destino cruel da literatura tradicional, a sua morte prematura (uma tradição de séculos, feita desaparecer em algumas décadas), quer fazendo-a renascer sob outras formas, dando-lhe outro destino, outro sentido, quer - remetendo para o "Romance de Pompeia" de Mourão-Ferreira - não desenlaçando os braços do ponto de eternização antigo por perigo de decomposição face ao que "por cima se tem passado".
Antes o fim que nos coube
Se é que fim pode chamar-se
 
Para que não morra com a terapia do tratamento institucional, ensaiamos empregar formas de a manter, se não viva, pelo menos visível. Além da conservação dos vestígios do passado, enfatizamos a atitude de dar a ver e ouvir a tradição, um húmus que só com o tempo se vai formando, que pressupõe uma morte não definitiva mas geradora de nova vida, um húmus onde outras culturas enraízam.
Reciclagem, transmutação, "transfiguração do banal"
Visamos prosseguir dando a conhecer manifestações artísticas da contemporaneidade que tenham subjacente a ideia de reciclagem, de transmutação, de "transfiguração do banal" (Arthur Danto) e incentivar uma prática culta actuando sobre materiais habitualmente considerados menores - evidenciando a sobrevivência do popular a nível da cultura urbana particularmente em casos de emigração e migração. O outro olhar sobre o próximo nasce na lonjura.
Haverá que continuar reflectindo e respigando restos de diferenças e identidades em estudos sobre diversos materiais, sujeito a atitudes ambivalentes enquanto património (i)material: cortiça (com a colaboração do sociólogo Manuel Lisboa e do consultor de empresas na área da comunicação, Carlos Oliveira Santos, autor de O Livro da Cortiça. Lisboa, 2000); calçada portuguesa, azulejos, bordados, linho, lã, sal, sabão, vidro, bolos e doces (cf. artistas plásticos como, por exemplo, Lourdes Castro, Ana Jotta, Ana Vidigal, Paula Rego, Carlos Nogueira, Ruth Rosengarten, Gilberto Reis, Rigo, Maria Felizol, Michel Laubu, Fátima Amorim, Danuta Wojciechowszka, Fátima Mendonça)."

Aproveito para recomendar a visualização do filme citado, é bastante esclarecedor. Tive oportunidade de assistir ao mesmo, numa iniciativa levada a cabo pela minha querida República Bota-Abaixo.

domingo, 30 de janeiro de 2011

A revolução egípcia e o património arqueológico

Danos no património arqueológico do Museu do Cairo.

Qualquer revolução assume contornos imprevisíveis, violentos e incalculáveis, especialmente aquelas que põem fim a décadas de frustração dos anseios democráticos das massas. Assim, muitas vezes os seus "efeitos colaterais", fruto da acção de indíviduos menos conscientes, podem ser danosos para o património arqueológico e histórico dos países onde elas acontecem, e os danos revelam-se particularmente gravosos num país como o Egipto, portador de um espólio arqueológico cuja importância me abstenho de realçar.

Duas notas impõem-se, no entanto:

1) A falta que faz uma direcção revolucionária esclarecida e consciente que canalize a violência para os locais onde ela deve ser aplicada;

2) A própria localização do Museu do Cairo, adjacente à sede do partido de Moubarak, logo, tornando-se um alvo fácil para a violência dos tais individuos menos esclarecidos acerca do carácter que deve ter a revolução, que deve ser uma revolução de cultura e de progresso. Porque de obscurantismo e ignorância, já nos chega regimes como o de Moubarak.

Assim, e apesar da destruição de património, de alguma forma uma característica própria (ainda que não inevitável) da transformação revolucionária das sociedades, esperemos apenas que a revolução atinja os seus fins. No entanto, quem quer fazer História, não deve desprezá-la...

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Tomem lá o que eu penso


Bom, pensei fazer uma longa e conturbada resmunguice por causa desta nova moda de trocar os salários pelas pensões mas entretanto confrontei-me com esta maravilha:

Tal como acontece com as crianças que comem muitos doces, também os dentes das orcas sofrem estragos quando estas mastigam determinado tipo de comida, como carne de tubarão. Segundo o Discovery News, as orcas (Orcinus orca), ou baleias assassinas, que nadam nas profundas águas do nordeste do Pacífico, alimentam-se sobretudo do tubarão-dorminhoco (Cephaloscyllium ventriosum). Mas comer tubarão tem um preço alto.



Os dentículos dérmicos (pequenos dentes que existem na pele dos tubarões, como se fossem escamas) provocam estragos nos dentes das orcas. “Encontrámos algumas baleias-assassinas mais velhas com os dentes gastos até à gengive”, diz John Ford, da Estação Biológica do Pacífico, em Nanaim, British Colombia, Canadá. O estudo que desenvolveu com a sua equipa foi publicado no jornal Aquatic Biology.



Porra!

Bem, já que o bloco de esquerda pouco mais faz naquele parlamento do que passar projectos que são no máximo tangencialmente relevantes ao caos político que nos rodeia, eu proponho-lhes virar umas quantas banheiras de pasta de dentes no oceano a ver se a coisa vai ao sítio.

Podemos combinar qualquer coisa com a BP.

Há vida para além das eleições?


De facto, a esquerda-de-todas-as-cores-e-às-bolinhas-amarelas já teve melhores dias. Perdeu as estribeiras durante a campanha, quando acusou todos os que não vislumbravam alternativas credíveis de serem imundos cavaquistas, e parece que ainda não as recuperou. Este texto do Daniel Oliveira reflecte bem isso. O caríssimo Daniel basicamente propõe que a reflexão que devemos fazer face à abstenção é ignorá-la. Exactamente, devemos fazer ouvidos moucos a quem não acredita na democracia e nos seus candidatos. Sim, porque aos olhos do Daniel o descrédito da democracia deve-se à burrice ou estupidez dos eleitorado, e de forma alguma reflecte o estado miserável que ela apresenta. As pessoas que não votam, muitas delas porque não acreditam sinceramente no futuro deste regime, não pensam, não se importam, ou são uns párias.

Então, e resumindo, o nosso Daniel apresenta uma resposta inaudita para combater o descrédito da política: aprofundar o divórcio entre esta e mais de metade do país. A metade que vota na mudança sazonal das moscas é que interessa, o resto é um bando de incompetentes que não merece o estatuto de cidadão. Quem sabe, daqui a uns tempos, o Daniel Oliveira venha a pedir a suspensão da cidadania durante seis meses.

Do nosso lado, nunca chegaremos a tal pessimismo. Muitas vezes, o divórcio entre os povos e os regimes que os governam são saudáveis. Se o regime é uma encenação, as pessoas desiludem-se da farsa, afastam-se, e novos regimes nascem. Longe de mim afirmar que a abstenção é um sinal de que isso vá acontecer num futuro próximo, simplesmente não penso que seja um sinal deveras preocupante no contexto das eleições presidenciais, pelo contrário, até pode ser positivo, como já expliquei antes. Há vida além do parlamentarismo burguês e há política além de Cavaco ou Alegre. Assim, esperemos que à medida que o regime se afunda, que surjam alternativas, fora de eleições, candidatos de ocasião e encenações eleitorais. Claro que isso é motivo de preocupação para “opinadores" (a auto-proclamação é do próprio) como o Daniel, que não avistam um horizonte político além das discussões quinzenais do parlamento, e concebem a democracia parlamentar e o capitalismo “soft” como o fim da história. Entretanto, voltemos para o Maghreb…

Com as barricadas a alastrarem-se....

....do Maghreb para o Médio Oriente, quando chegará a Intifada à Palestina? Oportunidade derradeira para golpear o imperialismo na região antes que as revoluções desemboquem em reformas que mudem tudo para ficar na mesma.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Kings of Leon entram na guerra com a série Glee - JN


Apoiado! Só fica bem a qualquer banda digna desse nome.

Compreendo perfeitamente o drama dos "Kings of Leon" em não quererem ver reproduzido qualquer dos seus temas numa série tão medíocre como a "Glee".

Já quanto à Lady Gaga e à Britney Spears é outra história, que queiram promover o seu "património artístico" nessa mesma série é só uma questão de coerência. Os amantes da mediocricidade vão exultar.

Este é um dos casos em que só fica bem às bandas protegerem as suas produções de garras puramente comercio-estupidificantes, que continuem a demanda!

Que venham muitos revolucionários de sofá (e os dos fetiches também)!


Obviamente que a minha última posta sobre o papel progressivo que a Web pode trazer aos movimentos revolucionários me rendeu algumas críticas dos "fetichistas", a maioria derivadas de um dogmatismo cego e de um pedantismo de bradar aos céus. Enfim, adiante...

Certamente que estarão a par dos protestos no Egipto, que reivindicam a expulsão de Moubarak do governo. Realço apenas dois parágrafos da notícia:

"O movimento de oposição Juventude 6 de Abril apelou através da sua página no Facebook para que os protestos continuem hoje "e depois, até à partida de Murabak".No serviço de microblogging Twitter, algumas mensagens têm vindo a passar nas últimas horas apelando a nova congregação no Cairo esta tarde: "São 12h31. Os protestos das universidades estão planeados para as 14h. Só então poderemos ver como o dia corre", era escrito por um utilizador que se identifica como "draddee". Outro, "Farrah3m", dizia "A todos: vai haver um protesto às 14h00 no cruzamento de Medan Alhasry".

Esta manhã, o Twitter, que foi um dos métodos usados pelos manifestantes para se organizarem ontem, revelou estar com o acesso bloqueado no Egipto. Em comunicado, a empresa, avalia, em tom crítico, que "a troca aberta de informação e opiniões beneficia as sociedades e ajuda os governos a melhor se ligarem às populações". Os serviços de internet e telefónicos estão, de forma geral, a funcionar intermitentemente em todo o país."

Pode não ser o factor central, mas não ver o papel benéfico que as redes sociais podem ter neste género de mobilização, é não querer vislumbrar o óbvio. Enfim, vozes de burro não chegam ao céu, e que hajam muitos “revolucionários de sofá” quando o incêndio chegar ao nosso país…

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

"Estou pronto então, para beber a cicuta que me foi assinalada, se for essa a decisão de quem pode"

Público - Juiz manda negócio dos submarinos alemães para julgamento

"O juiz de instrução criminal, Carlos Alexandre," (...) "disse estar consciente "do risco" da sua decisão que leva pela primeira vez responsáveis da Ferrostaal, a poderosa multinacional que integra o consórcio alemão que vendeu dois submarinos a Portugal, a sentarem-se no banco dos réus por crimes relacionados com a venda de equipamento militar."

Estão acusados sete gestores portugueses e três alemães.

Este mesmo juiz reagiu à ameaça dirigida pelo advogado de defesa da multinacional alemã, de que se o primeiro decidisse avançar para a fase de julgamento estaria a beber um veneno, com a seguinte declaração (citam os jornais):
"Estou pronto então, para beber a cicuta que me foi assinalada, se for essa a decisão de quem pode"!

Confesso que não me espantou a forma como um advogado, profissional com supostos deveres de deontologia, se dirigiu a um juiz de instrução.

Ameaça, seja dirigida a quem for, é uma ameaça.
Esta situação não deverá ser considerada normal, vai-se para tribunal por muito menos...

Não, as coisas em tribunal não funcionam/não devem funcionar como nas séries género "Boston Legal". Se calhar foi isso o que aconteceu, o Sr. Advogado quis contribuir com o seu quê de adrenalina para o caso...

Tudo isto nos surge com contornos bastante novelescos.

Espero que toda esta determinação que nos é relatada, se mantenha quando o processo cair na fase de julgamento, em que terá um colectivo de juízes a apreciá-lo.
Não fará nada mal à reputação do sistema de justiça que temos.
Infelizmente e de forma realista, não acredito nisso.

A corroborar esta convicção está o "buraco financeiro" confirmado recentemente pelo Ministério da Justiça a acrescentar uma lista infindável de tropeços, falhas, etc., deste nosso sistema de justiça, também apelidado de poder de soberania.

Assistamos.


Ah, Cavaco!

Cavaco prescinde de ordenado de Presidente e mantém pensões - JN

Parece que fizeram efeito as denúncias quanto ao património do nosso Excelso Presidente da República.

Diria alguém à primeira vista.

Não, pelos vistos, decorre da própria lei.

"A legislação que põe fim à acumulação de pensões com vencimentos do Estado a partir de 1 de Janeiro deste ano."

O espantoso é que só se ache razoável aplicar medidas no género em certas alturas.

Não será razoável por princípio? Ou será isto demasiado estapafúrdio?

Toda a notícia e alarido à volta do assunto só irá endeusar ainda mais o nosso "salvador Cavaco".

E é este o nosso fado com a comunicação social.

Avigdor Lieberman fora de Portugal e da Palestina

Hoje, às 17h30, vai haver uma demonstração de repúdio pela vinda do fascista Avigdor Lieberman, ministro dos Negócios Estrangeiros israelita a Portugal. A concentração será em frente à Assembleia da República.

Afinal havia outra

... a juntar ao rol de Causas Para O Crime (C-POC) e para todos os comportamentos indesejáveis.*

Desta vez, a culpa é mesmo da pessoa:

“O nosso estudo mostra pela primeira vez que a força de vontade que se tem quando se é uma criança influencia as probabilidades de se ser saudável e rico durante a vida adulta”, disse, citada pela Reuters, Terrie Moffit, primeira autora.

No fundo, o capitalismo triunfa ao agir organicamente no tecido da selecção natural entre pessoas que se controlam melhor ou pior. A verdade é que coisas como educação e estrutura não passam de trivialidades quando confrontadas com este derradeiro traço de personalidade:

Segundo o artigo, as crianças com pouco autocontrolo tinham mais tendência a ter problemas de saúde durante a vida adulta (27 por cento contra as crianças com mais autocontrolo que tinham só onze por cento), como pressão arterial elevada, obesidade, problemas de respiração ou doenças sexualmente transmitidas. Além disso, era mais provável serem dependentes de substâncias (dez por cento contra três por cento) como o tabaco, o álcool e as drogas, tornarem-se pais solteiros (58 por cento contra 26 por cento), terem dificuldade em gerir dinheiro e terem um registo criminal aos 32 anos (43 por cento contra 13 por cento).

Cum carago! Parece que ser bem comportado compensa. Aliás, atestemos ao que a Time tem a dizer sobre o assunto**:

Problems surfacing in adolescence, such as becoming a smoker or getting pregnant, accounted for about half of the bad outcomes associated with low self-control in childhood. Kids who scored low on such measures — for instance, becoming easily frustrated, lacking persistence in reaching goals or performing tasks, or having difficulty waiting their turn in line — were roughly three times more likely to wind up as poor, addicted, single parents or to have multiple health problems as adults, compared with children who behaved more conscientiously as early as age 3.

Não vou perder tempo com o velho discurso das "condições sociais" - até porque levanto as minhas reservas - chamando apenas a atenção para isto: a deslocação analítica dos problemas da sociedade para uma espécie de etiologia individual (em que se decompõem comportamentos em causas e consequências, ambos imputáveis ao desenvolvimento da pessoa) descambam rapidamente no novo paternalismo do discurso capitalóide.

Se és pobre, a culpa é tua. Esquecendo que o pobre e o rico são, eles próprios, consequência do desfasamento normal das formas tipificadas de poder actuais e que, assim, actuam antes da própria condição da pessoa, não se podendo de forma minimamente inteligente acoplar esses conceitos ao de uma deriva natural ao traço de personalidade deste ou daquela.

Enfim.

*Não li o artigo original, não o encontrei, pelo que parto da análise da notícia em si (portanto, da leitura que foi feita do trabalho científico) e me refreio de criticar os resultados dos investigadores - que espero, não terão cometido tamanho erro de indução.

**Continuando na pseudociência, a Time apresenta-nos esta interessante lista de artigos relacionados:

More on Time.com:

Tiger Moms: Is Tough Parenting Really the Answer?

Snooze and Lose: More Weekend Sleep Cuts Kids' Obesity Risk

Behind the Viral Video: What's the Deal with 'Baby Yoga'?

Link 1

Link 2

Revolucionarismo de sofá e fetichismo revolucionarista



Aconteceu que há dias, numa amena cavaqueira republicano - estudantil em Coimbra, entrei numa polémica acerca do papel que a blogosfera poderá eventualmente ter na actividade revolucionária, ou sobre a militância dos que se dizem revolucionários. Visto que agora, junto com os meus camaradas de tasca, resolvemos entrar no mercado blogosférico, impõe-se uma reflexão sobre o assunto, a qual partilho desde já na nossa recém – criada taberna, correndo sempre o risco que ninguém se interesse por ela. Enfim, quem não goste ou não se interesse, que vá para a tasca do vizinho, pois o que não falta por aí são tabernáculos bloguísticos bem acolhedores e variados…

A primeira imagem que foi realçada na nossa discussão é a do chamado revolucionário de sofá, categoria algo comum nos dias de hoje, sendo constituída por aqueles indivíduos que resumem a sua actividade de transformação da sociedade a escrever textos em blogs, e/ou Facebook. Sendo marxista, acredito que a transformação da sociedade apenas poderá advir de uma intervenção directa sobre o tecido produtivo, isto é, sobre o real, e não apenas sobre o abstracto, logo, obviamente que o revolucionário de sofá cumpre um papel diminuto, se o seu objectivo político é o derrube da ordem burguesa.

No entanto, tudo tem o seu pólo oposto: existe também o fetichista revolucionário (categoria criada por mim, e não pelo nosso colega de polémica), isto é, aquele que pensa que a metodologia organizativa e política revolucionária não se alterou nem um milímetro desde Outubro de 1917. Ou seja, a única modalidade de intervenção na sociedade será a sindical / partidária e todos os que não cumprem este requisito são inconsequentes, e todos os que gastam o seu tempo a escrever na blogosfera são intelectuais elitistas, e as suas reflexões webísticas meras masturbações eruditas. Ora, se a primeira pode ser considerada um desvio de direita, esta consiste, indubitavelmente, numa deriva ultra-esquerdista bem demarcada.

O pior erro de um marxista é ignorar os avanços da sociedade no plano da comunicação e da tecnologia que, mesmo em épocas recessivas ao nível das forças produtivas, continuam a desenvolver-se na sociedade capitalista. Seria igualmente um erro crasso ignorar o papel da Web nas tarefas revolucionárias do século XXI, que pode ser imenso ao nível da propaganda direccionada para vanguarda, e também ao nível da mobilização mais geral. Basta ler as notícias sobre a importância que o Facebook teve, por exemplo, na mobilização para as recentes manifestações contra Mubarak, no Egipto. Dir-me-á o nosso arguente que a blogosfera é um meio elitista, e que não chega a todas as camadas da classe trabalhadora. Correctíssimo. Mas assim, será que as epístolas trocadas entre Lenin e Rosa Luxemburgo eram lidas por todos os operários de Petersburgo? Será que o facto de não chegar todos reduz a importância que chegue a alguns? Será que todas as camadas da classe trabalhadora lêem o jornal do seu partido? Certamente que não, mas não extrai a importância da continuidade da sua publicação.

Não considero que o modelo leninista de organização partidária esteja esgotado, mas simplesmente ele tem de se adaptar aos tempos que correm. As tarefas organizativas e políticas do jornal de uma eventual organização revolucionária não perdem o seu lugar, mas têm inevitavelmente de ser complementadas com informação na Web, que é um meio de comunicação potentíssimo nos dias que correm, e onde o capital e respectivas forças de repressão (ainda) têm enormes dificuldades em controlar. Minimizar este facto, e partir do pressuposto que hoje em dia as tarefas de agitação e discussão apenas podem ser efectuadas à volta do jornal do partido e à porta da fábrica, é de facto uma deriva fetichista revolucionarista. Obviamente que decisões políticas oficiais não podem ser tomadas através do Facebook, nem devemos resumir a nossa actividade revolucionária ao blogspot.com, mas não ignoremos o espaço livre que a Web oferece para complementar as tarefas de propaganda/agitação/discussão.

Admito que quem conseguiu aturar este texto até ao fim pensará que não passa de uma masturbação intelectual. Enfim, actividade revolucionária sem um pouco de estimulação auto-erótica seria uma seca, não acham?...