quinta-feira, 31 de março de 2011

Do sectarismo recíproco



Tanto o PCP como o BE já deixaram claro que não vão aceitar o repto lançado tanto por uma das correntes internas deste último partido, o Ruptura/FER, assim como por vários militantes independentes de esquerda. Ou seja, não se vão coligar eleitoralmente, o primeiro escudando-se em supostas “divergências programáticas”, o segundo no sectarismo do primeiro, como se o BE estivesse limpo do pecado do sectarismo. Enfim, contentar-se-ão em manter o seu feudozito eleitoral, constituindo-se ambos como a ala esquerda do regime que os sustenta.

Será que é porque sabem que, caso formassem governo, seriam pressionados a aplicar políticas verdadeiramente de esquerda? Será que é porque sabem que, caso as aplicassem, poriam o regime em cheque e a mostarda rapidamente chegaria aos narizes dos mandadores da alta finança? Será que é porque temem abalar as fundações do regime? Se assim acontece, no fundo, são coerentes com o seu carácter reformista. Não lhes interessa abalar o regime e, no caso do BE, seria como morder a mão que o alimenta. É preferível permanecer no campo do “contra-poder” e apelar a uma fórmula abstracta, repetida até à exaustão, de “unidade das esquerdas”, chavão tão inócuo como a “esquerda grande”, cuja dimensão será proporcional ao vazio político, como se viu aquando do Alegre fiasco.

No entanto, isto pode ser uma mera “teoria da conspiração” da minha parte, e o obstáculo à unificação dos partidos de esquerda não passa, porventura, de um mútuo sectarismo que os afecta, o que não é menos grave. Entretanto, cá esperamos pela cisão dos sectores de oposição de esquerda do BE, a ver se essa proposta de fundação de uma nova força política, socialista e revolucionária, se consubstancia.

7 comentários:

João disse...

Apesar de concordar com parte do teu comentário, gostava com a parte que concordo evidenciar um ponto de vista que acho bastante irónico !!

Como é que a RUPTURA/FER consegue vir com a conversa da unificação da Esquerda (neste caso do BE e do PCP) se eles próprios são, legitimamente ou não, um dos principais responsáveis pela fragmentação do Bloco de Esquerda? É um autêntica fantochada este novo lema esquerdista. Porque para haver uma união partidária formal ou informal, tem que haver previamente união dentro dos respectivos partidos políticos e nem isso existe, pois consecutivamente, vejo militantes do RUPTURA ou de qualquer outra corrente política do Bloco de Esquerda a criarem e a alimentarem discussões sem qualquer nexo político, ideológico ou programático.

Assim, o que eu vejo aqui, é uma autêntica irresponsabilidade e demagogia, porque se criticamos o PSD por ter chumbado a apreciação do PECIV para mais rápido chegar ao poder, temos no outro lado o RUPTURA (ou mesmo o Bloco de Esquerda ou o Partido Comunista, ainda não consegui perceber bem ..) a proceder exactamente da mesma forma. Assim sendo, gostaria que quem alimenta esta vontade me responda a uma simples questão: de que vale existir uma Assembleia de ESQUERDA, através da união do Bloco e do PCP, se posteriormente vai existir uma série de conflitos internos que são vão contribuir, consequentemente, para a criação de instabilidade política, económica e social? Com isto deixo um conselho: antes de ambicionarem tanto poder, tentem organizar com extrema precaução todos os passos. porque se como eu, são verdadeiros militantes socialistas, não defendam acções que com grande probabilidade só irão manchar o nome da ESQUERDA SOCIALISTA.

Anónimo disse...

3 dias depois deste post, as coisas parece que já não são bem assim: a FER já desmentiu qualquer aproximação por "conta própria" ao PCP e o F. Louçã, vi na tv, propõe uma aproximação dos 2 partidos e de outras forças de esquerda com vista à disputa da próximas eleições. A única recusa conhecida até agora foi do PCP por declarações de Jerónimo de Sousa que, ao que parece, descarta essa possibilidade. É preciso dar algum tempo para que as direcções dos partidos se convençam que isso é uma exigência das bases e que não implica, nem isso era bom, qualquer fusão "eterna" dos 2 partidos e de outros que porventura se juntem, mas que saibam também que nesta hora, uma prévia recusa da unidade os desmascara como unicamente preocupados com o "perigo de contágio" dos seus tradicionais votantes, da manutenção dos seus empregos partidários e do medo que, também eles, têm do povo.

João disse...

Caso analisemos bem a situação político-partidária, segundo as discussões e votações no Plenário, existe uma espécie de unificação de ambos os partidos, ainda que "informalmente" porque ambos são uma oposição forte (não no sentido de conseguirem fazer ouvir a voz da esquerda, mas votam quase tudo contra o que o governo e os restantes partidos propõem, pelo menos matérias fundamentais na organização política, económica e social do país). Veremos o que sair daqui. Relativamente ao "medo que o têm do povo", não sei até que ponto isso seria um perigo, porque bastava o PCP fazer uma ou duas conferências de imprensa ou um comunicado ao militantes que eles passavam a idolatrar o Bloco de Esquerda ahah - lavagem cerebral comunista no máximo esplendor !!

Anónimo disse...

Se me permitem e com vossa licença, "Sectarismo Recíproco", o caralho!"

"Lisboa, 03 abr (Lusa) -- O PCP decidiu hoje ir a votos em coligação com o PEV e expressou a expectativa de que as eleições permitam a "formação de um governo patriótico e de esquerda", aberto ao BE mas não ao PS de Sócrates."

"O líder do Bloco de Esquerda anunciou esta sexta-feira que vai propor à VII Convenção, de 7 e 8 de Maio, uma estratégia de unidade à esquerda, no sentido de diálogos com o PCP, sindicalistas e socialistas, ressalvando não ter «ilusões» sobre o actual PS."

Tiago Silva disse...

Caro João, o debate fraternal de ideias, mesmo que seja acirrado, só pode ser benéfico para o avanço da esquerda socialista, desde que seja honesto. Não devemos temer fraccionamentos e discussões acesas, desde que o debate seja estabelecido de forma honesta, democrática e concretizada por unidade na acção. A alternativa a isto não é uma união genuína, mas um monolitismo burocrático, tal como conhecemos nas organizações estalinistas.

Caro anónimo (o primeiro dos dois), subscrevo praticamente a totalidade do seu comentário, excepto na confiança que deposita no Francisco Louçã. Como deve saber, militei no BE durante anos e, deixe que lhe diga, o sectarismo bloquista não é menos aguçado que o comunista. Enquanto organizado no BE, sempre defendi uma plataforma eleitoral, com base num programa comum, entre os dois maiores partidos da esquerda, de forma a propor ao país uma alternativa de poder. Da parte de Louçã e companhia, essa posição apenas me valeu críticas e acusações de ”colagem” ao PC. Quem me garante que essa "abertura" não emergiu agora porque a direcção do BE sabe de antemão que a unificação não vai acontecer? Caso se verifique este cenário, estariamos perante mais um triste espectáculo de tacticismo político e retórica enganadora. Espero que esteja errado, mas franzo o sobrolho a esta mudança súbita de táctica.

Assim, segundo a minha análise, o Jerónimo não é o único obstáculo a uma plataforma BE-PCP, mas, pelo contrário, o sectarismo continua a ser o que sempre foi: recíproco. A realidade é que não consta que algum esforço tenha sido encetado, da parte da direcção bloquista, no sentido da realização de uma solução unitária, fora as declarações vagas nos sentido da ”unidade da esquerda”. De forma que, como o anónimo justamente referiu, é uma questão a ser discutida pelas bases dos dois partidos, em diálogo permanente com a esquerda ”desalinhada”, e esperemos que aquelas pressionem as suas direcções a trilhar o caminho que já devia ter sido tomado há muito tempo...


Caro anónimo II, primeiro que tudo, o que disse ao I serve para como resposta às suas citações. "Diálogos" com o PCP já temos no BE há muito tempo, o que nós queremos é unidade táctica com base num programa de governo comum. Isso nunca vi nem o PCP, nem o BE propor. Vai ter que me desculpar, mas o sectarismo é recíproco, sim senhor, e nem todos os palavrões do mundo lhe dão mais razão.

Joao disse...

Caro Tiago Silva,

Desde já agradeço o teu comentário e obviamente sou obrigado a concordar com ele. Mas caso prestes atenção ao que eu escrevi no meu comentário, verás que eu não digo que o puro debate político seja prejudicial o que eu disse é que "vejo militantes do RUPTURA ou de qualquer outra corrente política do Bloco de Esquerda a criarem e a alimentarem discussões sem qualquer nexo político, ideológico ou programático". Assim sendo, torna-se bastante lúcida a minha ideia em relação ao debate político, pois uma vez mais afirmo, o debate político em democracia desde que se revele construtivo, coerente e respeitador é necessário, agora o debate caracterizado pela inexistência de "nexo político, ideológico ou programático", onde apenas imperam argumentos fracos e sem nenhum proveito político para um debate onde se tenta encontrar alternativas, para mim é dispensável! (o mesmo se aplica à fragmentação partidária).

Tiago Silva disse...

Sim, eu compreendo, o que eu postulei é um príncipio geral, muitas vezes não aplicado na orgânica de funcionamento do BE. Na minha opinião, tal acontece porque, a maior parte das vezes, o debate não é estabelecido de forma honesta e fraternal, tentando-se obviar à democraticidade sempre que possível. Enfim, mas não desviemos a discussão para questões internas bloquistas, penso que neste momento, isso não é o mais importante :)